Há diferentes formas de encarar a Bíblia. Qual é a correta?

Existem diferentes maneiras ou abordagens sobre o que se pensa ou que uso se faz da Bíblia. Haverá uma maneira “mais correta”? Faço aqui uma breve discussão, e sugestão sobre esse tema:
Para a massa da população mundial, cooptada por uma sociedade essencialmente egocêntrica e orientada ao entretenimento e demais variantes do hedonismo, a “abordagem” predominante com relação à Bíblia é a não-abordagem, ou seja, simplesmente ignorá-la como algo ultrapassado, cujo ensino foi corretamente eliminado das escolas, a fim de não contaminar nossa preciosa juventude com conceitos anti-científicos, sentimentos de culpa e repreensões do alto. Creio que as evidências testificam sobre o beco sem saída ao qual essa abordagem tem nos levado: em um extremo vemos casos de mães que descartam seus bebês em sacos de lixo, filhos que trucidam seus pais, assaltantes que cometem homicídios hediondos sem qualquer resquício de misericórdia, e em outro extremo um passivo contingente de mortos-vivos espirituais, que consomem as notícias sobre aqueles casos como se fossem fatos inevitáveis da vida, efeitos sem causa mais profunda que a personalidade distorcida dos criminosos que tais atos praticam.
Uma segunda abordagem sobre a Bíblia é vê-la como obra literária da antiguidade, com trechos que servem para elevar nossa auto-estima e provocar sentimentos gratificantes, como são as milhares de promessas de bênçãos divinas e as lindas passagens poéticas que permeiam o texto bíblico. Ou seja, um conveniente tipo de massageador de ego. Evidentemente, os que usam a Bíblia dessa maneira fazem uso de um sutil filtro mental que seleciona os trechos que produzem o efeito esperado e sistematicamente descarta aqueles cujo conteúdo parece mais ácido. O problema é que essa abordagem reduz a Bíblia a apenas mais um livro de auto-ajuda, e por sinal não dos melhores, já que há autores especializados no assunto, que cumprem melhor esse papel.
Uma terceira abordagem é ter a Bíblia como um extenso conjunto de preceitos e regras sobre uma infinidade de temas, que sirva como referência sobre o que devemos fazer para estarmos “de bem” com Deus. Essa é a abordagem legalista religiosa, da qual confesso que compartilhei por mais de dez anos. O curioso é que a própria Bíblia atesta o fracasso de tal abordagem, bastando ler nela a história do povo judeu, com seus inconsequentes juramentos de guardar a lei de Deus por meio de esforço humano e as inevitáveis quedas que isso produz, até que finalmente Deus anuncia um novo pacto que não dependeria mais do homem para cumpri-lo, já que agora, transcorridos os vários séculos de altos e baixos espirituais do povo judeu, de Moisés a Malaquias, a lição estava muito clara: é impossível para o homem natural, por mais religioso que deseje ser, viver sob um padrão divino de vida. Além do frustrante e inevitável sabor de fracasso que essa abordagem deixa, seu mais grave risco é que ela nos desvia da razão primeira pela qual a Bíblia foi escrita, a qual tratamos a seguir.
Felizmente existe uma quarta abordagem com respeito à Bíblia, que é a verdadeira razão pela qual esse livro divinamente inspirado foi escrito e milagrosamente preservado até os dias de hoje: revelar Jesus, o Cristo, o Filho do Deus vivo. O leitor de espírito aguçado (pela graça do próprio Deus) encontrará Cristo em cada página da Bíblia. E isso é vontade do próprio Pai Celestial, que decidiu fazer convergir no Filho absolutamente todas as coisas, desde o princípio até o fim dos tempos (João 1.1; Romanos 11.36; Efésios 1.10; Apocalipse 21.6). O próprio Cristo afirmou isso aos mais sábios líderes religiosos da época (os quais sinceramente dedicavam suas vidas à terceira abordagem descrita acima): em João 5.39 Jesus afirma que as Escrituras (todas elas) falam dEle, coisa que havia passado desapercebida pelos fariseus em seu afã religioso legalista.
Por isso, ao ler a Bíblia, sua tarefa é perguntar: “Qual é a relação entre Jesus e o que estou lendo aqui? Qual é a estrada ou ponte entre isto e Cristo?”. Nesse sentido, concluo com algumas poucas entre as inúmeras citações encontradas no livro “Jesus – a Theography“, de Leonard Sweet e Frank Viola:
Mas se soubesses, ó Trifo – continuou ele – quem é Aquele que uma vez foi chamado o Anjo do Grande Conselho e o Homem por Ezequiel, e um “semelhante ao Filho do Homem” por Daniel, e Menino por Isaías, e Cristo e Deus a ser adorado por David, e Cristo e a Pedra por muitos, e Sabedoria por Salomão, e José e Judá e Estrela por Moisés, e o Leste por Zacarias, e Servo Sofredor e Jacó e Israel por Isaías novamente, e Cetro e Flor e Pedra Angular e Filho de Deus, não terias blasfemado dAquele que veio, e nasceu, e sofreu, e ascendeu ao céu, e há de voltar, e do qual as doze tribos se lamentarão. Pois se houvesses compreendido o que foi escrito pelos profetas, não terias negado que Ele é Deus, Filho do único, eterno e inexprimível Deus! (Justino Mártir, ano 103-165 d.C.) 
O significado oculto da Escritura inspirada nós buscamos rastrear, com diferentes graus de sucesso; entretanto nos apegamos com confiança à firme crença de que esses eventos históricos e a narrativa dos mesmos sempre contêm uma prefiguração das coisas por vir, e devem sempre ser interpretados com referência a Cristo e sua Igreja, a qual é a Cidade de Deus. (Agostinho, 354-430 d.C.)
Qual é, então, a sombra; qual é a verdade?… Você certamente  já viu o retrato de um imperador, preparado sobre um fundo escuro, em torno do qual o artista desenha linhas brancas, figurando um imperador, um trono imperial, e cavalos por perto, e guardas, e prisioneiros de guerra prostrados abaixo. Agora, quando você vê apenas o esboço dessas coisas, você não conhece tudo mas tampouco desconhece tudo, pois sabe que um homem e um cavalo estão desenhados ali, embora não os possa distinguir. Mas você não sabe com exatidão que tipo de imperador ou que tipo de prisioneiros são, até que venha a verdade das cores para tornar as faces distintas e claras. Pois assim como você não exige tudo do esboço antes que venha a verdade das cores, do mesmo modo considere comigo o Antigo e o Novo Testamento, e não requeira de mim a completa verdade nos tipos do Antigo Testamento… porque, tal qual na pintura, até que venham as cores, o que temos é apenas um difuso esboço. (João Crisóstomo, 347-407 d.C.)
Em toda a Escritura não há nada além de Cristo, seja em palavras claras ou palavras intrincadas… Toda a Escritura é sobre Cristo, se olharmos para o seu significado mais profundo, embora superficialmente possa soar diferente… Está acima de qualquer dúvida que as Escrituras apontam somente para Cristo… Todo o Antigo Testamento se refere a Cristo e está totalmente de acordo com Ele… O Novo Testamento não é mais do que a revelação do Antigo, tal como um homem que sela uma carta e depois a revela. Portanto o Antigo Testamento é uma epístola de Cristo, que após sua morte a abriu e fez com que fosse lida através do Evangelho e proclamada em toda a parte. (Martinho Lutero, 1483-1546)
Não há qualquer risco de raciocínio circular em Cristo; você pode olhar para Jesus mil vezes que você terá, se desejar, mil aspectos distintos. Se você se debruçar sobre um dos livros do Velho Testamento você o verá sob uma vasta variedade de aspectos. Você o verá como o cordeiro pascal; você o verá como o bode expiatório; você o verá como o boi, forte para o trabalho, e depois o verá como o cordeiro, paciente para sofrer; você o verá como a pomba, cheia de inocência; você o verá no sangue aspergido, no incenso queimado, na pia cheia de água; você o verá na vara de Arão que floresceu, e no pote de ouro cheio de maná; você o verá dentro da arca e também o verá sobre a arca; dentro da arca você o verá tendo a lei dentro do coração, e sobre a arca você verá a luz dourada e o trono de misericórdia, e dirá: “Cristo está aqui!”. Em todo tipo você verá Cristo, em diferentes formas também, de tal modo que concluirá: “Não importa quantas vezes eu olhe, sempre encontrarei algo novo nEle!” Pois em todo texto na Escritura existe uma estrada que leva à metrópole das Escrituras, que é Cristo. Portanto, meu querido irmão, quando você se deparar com um texto, o seu negócio será perguntar: “Onde é que está a estrada que leva a Cristo?”. Até agora, jamais encontrei um texto que não contivesse uma estrada para Cristo. (Charles Spurgeon, 1834-1892)
Na Lei encontramos a fundação para Cristo. Nos livros históricos encontramos a preparação para Cristo. Nos livros poéticos encontramos a aspiração por Cristo. Nos profetas encontramos a expectativa de Cristo. Nos evangelhos encontramos a manifestação de Cristo. Em Atos encontramos a propagação de Cristo. Nas epístolas encontramos a interpretação de Cristo. E em Apocalipse encontramos a consumação de Cristo. (Norman Geisler, 1932- )

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